segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Um general na Casa Branca? Não descartem ainda o nome de David Petraeus. ... por Luiz Carlos Azenha








WASHINGTON - Enquanto o PSDB e o DEM se
entregam a uma tática eleitoral carbonária, tendo
como base política a minoria que odeia o
governo Lula e como ferramenta a mídia
corporativa brasileira, nos Estados Unidos
o discurso de quebrar o "gridlock", ou seja,
de superar a paralisia governamental causada
pela polarização entre republicanos e democratas,
é um dos fatores que impulsionam a candidatura
de Barack Obama.

Obama é chamado de "Osama" pela extrema-direita,
que treme tanto quanto a máquina partidária do
Partido Democrata diante do fenômeno da temporada.
Hoje, em New Hampshire, o senador de
Illinois continua a arrastar multidões de curiosos
para seus eventos políticos, gente que tenta entender
os motivos que levaram um político negro a uma
folgada vitória nas assembléias de Iowa, que
inauguraram o calendário de escolha dos candidatos
à Casa Branca. Iowa, um estado em que mais
de 90% dos eleitores são brancos.

Está claro que "Osama", no discurso apavorado
dos extremistas republicanos, arrastou milhares de
novos eleitores às assembléia de Iowa. Venceu
esmagadoramente entre os jovens. Em New Hampshire,
um estado em que mais de 40% dos eleitores
se declaram independentes, eles podem votar tanto
nas prévias do partido Democrata quanto
nas do Partido Republicano.

Há indícios de que os independentes e até
republicanos mais moderados estão dispostos
a cruzar a linha partidária e participar das prévias
democratas para dar apoio ao senador de Illinois.
Alguns porque realmente querem ver a derrota de
Hillary Clinton, a quem não suportam. Outros porque
acreditam nas palavras de Obama. E os mais
jovens porque decididamente acham que é preciso
mudar tudo em Washington.

Qual é o discurso de Barack Obama? Ele não ataca
adversários. Diz que é preciso formar uma
coalizão entre democratas, independentes e até
republicanos para superar a paralisia em Washington.
Sem dizer isso de forma explícita, faz um contraste
com a estratégia de Karl Rove, que elegeu
George W. Bush com a tática da polarização,
tendo como base a direita cristã.

Obama diz que Washington é refém dos lobistas
de grandes corporações, que controlam o
Congresso através de doações de campanha.
Diz que a guerra no Iraque foi um erro, que
desviou os Estados Unidos da tarefa fundamental,
a de combater Osama bin Laden. Diz que vai fazer
diplomacia com todos os países, inclusive com aqueles
que o governo Bush colocou na lista de inimigos.
Promete aumentos anuais do salário mínimo. Tem
um projeto que permitiria a todos os americanos ter
seguro de saúde - cerca de 40 milhões não tem
cobertura hoje em dia.

A campanha dele é feita com propostas bem definidas
e concretas. E, ao contrário do que muitos imaginam,
é uma organização que até agora tem se mostrado
impecável, cumprindo a promessa, por exemplo,
de levar novos eleitores a participar do processo político
- em Iowa, o número de participantes das assembléias
democratas quase dobrou em relação a 2004.
É a revolta dos "nerds".

Obama é advogado formado em Harvard e as amizades
que cultivou na escola de elite dos Estados Unidos foram
importantes para a campanha que faz agora. Ele é casado
com Michelle, uma advogada formada em Princeton
e Harvard que participa ativamente da campanha.

Como já escrevi, Barack Obama é uma espécie de Lula
americano, no sentido de que se apresenta como
capaz de fazer a ponte entre a Washington que existe e
a Washington que os eleitores americanos acreditam ser
possível. Ele tem 46 anos de idade, quatro a mais
do que John Kennedy quando este se tornou o
mais jovem presidente americano.

Os assessores de Obama temem que ele seja assassinado,
diante da ameaça que representa para os ideiais da
minoria da extrema-direita, que quer os Estados Unidos
um país "branco, anglo-saxão e cristão". Desde o início da
campanha o senador é protegido pelo Serviço Secreto, o
mesmo que protege o presidente Bush de atentados.

Barack Obama apela aos jovens americanos não só porque
é jovem. Ele estimula o idealismo e diz que as metas deste
século devem ser o combate ao terrorismo, à pobreza, às
doenças e à destruição ambiental. Ele quer livrar os Estados
Unidos da dependência do petróleo, apostando em
combustíveis alternativos. Do ponto-de-vista prático,
pode abrir o mercado americano para a importação
de álcool produzido no Brasil se de fato conseguir
formar uma coalizão de republicanos e democratas para
apoiá-lo no Congresso. O álcool produzido com
cana-de-açucar no Brasil é muito mais barato que o álcool
obtido do milho.

Mas isso é difícil de antever, uma vez que os produtores
de álcool de milho tem apoio bipartidário e estão espalhados
por estados eleitoralmente importantes, especialmente no
cinturão do milho, que inclui Iowa e Ohio - este último o estado
que decidiu as eleições de 2004 em favor de George W. Bush.

Outra área em que Obama agrada aos jovens tem a ver
com a internet. Ele quer uma rede nacional de acesso à
banda larga. Diz que assim como as ferrovias e as rodovias
foram essenciais para integrar a economia americana,
é preciso fazer o mesmo com a internet. O Japão já tem
uma rede nacional de fibra ótica implantada com forte
incentivo estatal. Mas, nos Estados Unidos, tanto as
empresas de telefonia quanto as de tevê a cabo se opõem
a esse tipo de rede, alegando que seria uma interferência
indevida do estado na economia. Enquanto isso, as
redes mais modernas da internet se concentram nas
regiões e bairros nobres, de gente que pode pagar caro,
contribuindo para o "apartheid" digital.

Enfrentar os lobbies de produtores de álcool de milho,
das empresas de telefonia e de TV a cabo seria um dos
desafios de Barack Obama em Washington. Ele teria
de peitar também o complexo industrial-militar, que está
ganhando dinheiro como nunca com duas guerras ao mesmo
tempo. E a Exxon-Mobil, que teve lucro recente de mais e
40 bilhões de dólares com o preço do barril de petróleo
a cem dólares. E o Wal Mart, a maior empresa do mundo,
que paga salários baixíssimos aos empregados e
combate os sindicatos. Obama acha que é possível negociar
e dobrar todos esses interesses.

O fenômeno Obama não pode ser isolado da conjuntura
mundial, em que a resposta à globalização e à ocupação
do Iraque parece ter dado gás àqueles que pregam o
fortalecimento dos estados nacionais.

O fenômeno Obama não pode ser isolado da conjuntura
econômica dos Estados Unidos, à beira de uma daquelas
recessões cíclicas do capitalismo. Barack Obama não se
apresenta como candidato dos negros, mas como candidato
capaz de juntar democratas, independentes e republicanos
para enfrentar o déficit público causado, acima de tudo, pelos
bilhões de dólares gastos no Iraque e no Afeganistão.

A maior ameaça aos democratas em geral e a Barack
Obama em particular é a inexperiência dele em política externa.
Se algum atentado terrorista de grandes proporções
acontecer, especialmente nos Estados Unidos, os republicanos
não perderão a oportunidade de aterrorizar os eleitores,
exigindo algum durão para ocupar a Casa Branca. Daí as
chances de alguém como o senador John McCain, que foi
prisioneiro no Vietnã, é herói de guerra, tem grande experiência
em política externa e também apela aos independentes.

McCain poderia convocar para seu vice o general David
Howell Petraeus, que comanda a nova estratégia americana
para conter a violência no Iraque, que parece ter dado
algum resultado. Especula-se que o general teria
pretensões políticas. Isso se o próprio Petraeus não for convocado,
de última hora, para enfrentar ele mesmo o fenômeno Obama.
Mas ainda é muito cedo para fazer previsões seguras em
um momento de tantas incertezas.

Publicado em 7 de janeiro de 2007

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